Ela
diz que sente vontade de algo que não existe. Às vezes prefere fechar as
cortinas e se encerrar em si. Passa um dia inteiro entre palavras não ditas,
tentando mensurar o que tem por dentro. Ora, meu anjo, as tripas dos animais
não são tão diferentes das suas.
Ela
diz que tem dormido muito e muito mal. Ela está doente. Acredita que pode
morrer a qualquer momento mas não é capaz de se permitir viver o quanto pode.
Como consegue persistir nisso? Aprendeu a fechar os olhos quando sente dor,
como se aliviasse. E desde então passou a cerrar cada vez mais seus olhos. Abre
os olhos agora, aproveita que ainda podes ver a luz! Então caminha, sem saber
ao certo, vai. Abre essas cortinas, abre as janelas, abre a porta e vai. Corre
pela rua, sente o vento, a dor, o calor do teu corpo ao suar: estás viva. Te
emociona com as crianças e sente que a vida pode continuar pulsando de alguma
forma. E então corre! Com força, com vontade. Meu anjo, não liga se vais parecer
estranha aos olhos deles: corres tão rápido e eles não costumam notar as coisas
como tu sentes.
Ela
sabe que costuma ver além do que se vê. Ama e sofre ser assim. Mas fechar os
olhos não a torna como os outros. Ainda é noite. As cortinas continuam
fechadas. Quem sabe amanhã. Quem sabe ela possa abrir os olhos e redescobrir
nas cores, uma razão para abrir as cortinas todos os dias, seja quantos forem 'todos os dias'.
Um comentário:
que texto incrível.
adoro seus textos, mas esse me ganhou de uma maneira foda.
enfim, essas épocas da vida que vc não consegue se achar dentro de si mesmo e que tudo te dá medo. "ela" parece eu. :/
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