terça-feira, 7 de dezembro de 2010

guarda-chuva

Nessas horas eu me lembro de morrer. Boto as luvas de borracha e sem apego como quem examina um cadáver que nunca antes teve nome. Vasculhar o que ainda tem de mim, sem perfeitas condições e não mencionando os órgãos que nesse ano me foram amputados.

Vamos nos abraçar e ser felizes. Você errou a concordância. O desespero de um futuro próximo sem nada nada ninguém nada e tudo vazio e incerto me faz te segurar com força e muitas vezes no dia. Desculpa eu preciso dizer que isso não é afeto. Eu nunca disse que eu não gosto de você. Eu não tocaria no corpo dele do jeito que toco no seu corpo. O nojo me daria ânsias. De vômito. Antes um cadáver. Antes o cadáver do meu amor. Eu me agarro em ti às vezes com mais força que carinho. Eu quero evitar voltar pro escuro e sozinho de todos os dias. A dor na cama esperando pelo sono, até que o sono ainda seja maior que a dor. A morte de todos os dias. O rim que torce e me curva a espinha. O rim que sangra pelo mijo pra me dizer o quanto eu estou morto e não tenho mais chances e as coisas só devem piorar. Não posso mais pensar nisso. Apenas me desculpe.

- O que você construiu esse ano?

- Sabe, esse ano eu tenho que admitir que muitas coisas mudaram. Estou surpreso com meu amadurecimento em demasia, você entende? Ah doutor, eu aprendi muitas coisas, sem dúvidas eu construí muitas coisas. Admito que continuo sendo o mesmo ser amputado, uma cabeça asquerosa, que se movimenta e sangra. Mas esse ano eu adquiri algo quê... algo que me acompanha até hoje. É certo que tudo que como a situação crítica dos meus órgãos, enquanto eu o tiver eu o vejo cada vez mais podre. Mas com os outros restava a perfeição, a imagem que eu tive na minha cabeça, quando os perdia. Acho que prefiro vê-los podres ao meu lado do que perfeitos e longe. Tocá-los com minhas doenças os apodrece. Tudo bem contanto que continuem meus. Doutor eu só queria dizer que durante todo esse ano eu usei apenas um guarda-chuva.

Eu to deixando de te amar. É uma pena ser aos poucos. Você agora tem sido um corpo amputado, que me excita mais que qualquer outra coisa. Você é ridículo e seu amor é ninguém. Eu sinto nojo de me excitar te olhando. Suas camisetas têm as piores frases, você passou a se vestir mal. Você bebe e fica ridículo. Eu odeio sentir que meu amor acaba morto na lata de lixo e com cheiro forte. Eu odeio ser fraco. Eu odeio saber que enquanto eu te amava eu não tinha tanto tesão por você. O meu amor morre antes de um minuto, todos os dias, mais de uma vez por dia. Você não me merece e eu não mereço nada além de mim mesmo. Nada além de morrer.

- Doutor: esse ano eu aprendi como enlouquecer todas as noites e me manter são por conveniência durante os dias. Me sinto bem assim.