domingo, 22 de abril de 2012

sobrecorrer

To com uma vontade de sair correndo. Me perguntaram o porquê. Fiquei imensamente feliz em poder responder. Porque eu gosto de correr. Dessa vez eu não quero fugir. Porque eu gosto de correr. Eu gosto da dor que faz o baço, eu gosto do ardido que desce pela garganta a cada respiração. Gosto de lembrar que minhas pernas doem onde eu nem imaginava que poderia doer. Na verdade, eu gosto de sentir vivo. Eu gosto do suor, do coração pulsando, reverberando até nos fios do cabelo. Dessa vez eu não queria não me atrasar. Porque eu gosto de correr, sem nada a perder. No fim eu tenho pouco a perder. No final tudo se acaba, e se acaba, acaba bem. Eu corro e deixo todas as coisas pra trás. Eu deixo meu trabalho, minha faculdade, deixo minha família, deixo minhas células mortas e a água que o meu corpo expele. No fim eu tenho pouco a perder e o mundo todo na minha frente. Dessa vez eu não quero não ser visto. Eu corro porque eu gosto de correr. Eu corro cru, sem pensar, corro pra chegar na liberdade. Chegar na liberdade e empurrar pra longe por lembrar que eu corro porque eu gosto de correr e é só isso. Eu corro como uma árvore, como o mar e como o vento. Sem pudor, sem razão, sem explicação; descaradamente violentamente intensamente cru. E no fim eu tenho um pouco mais e um pouco menos de vida.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

céu

Tem um céu no fim do teu nome. É pra lá que eu caminho entre eu e tu, sempre mais longe e mais rápido e mais entregue. Cada letra mais entregue. É de lá que eu me jogo quando te encontro, no céu, no fim do teu nome. Passo o dia, a semana numa queda-livre, esperando te encontrar e subir no teu nome até o céu. Você não sabe a angústia de estar sem chão.

domingo, 8 de abril de 2012

nós plantamos bananas

Nós plantamos bananas.
Todo e cada ser humano tem uma banana pra si.
Não importa o tipo, qualquer coisa.
Cada um é uma banana na fruteira.
Nossas bananas amadurecem. Já é hora.
Nós queremos pássaros por perto. Nós cegos queremos o som e nós surdos queremos as cores. Nós sensíveis queremos seus olhos brutalmente livres.
Já é hora de descascar a banana, sair da casca, desnudar, adentrar, expor o sensível.
Então é hora de estar aberto, em um pé de árvore, em pedacinhos ou não. Padecemos por nossas bananas!
Nossas bananas encontram os pássaros. E a plenitude se rompe na dança do pássaro e sua banana.
Morte: a tendência de todas as coisas. Nossas bananas não duram pouco mais de uma semana.O que as transborda de razão em viver também as mata sem pudor: alimentar um pássaro é apodrecer entre bicadas e saliva.
O amor de nossas bananas e os pássaros.
Dura pouco.
O amor
Dura pouco.
Nós plantamos bananas, nós queremos pássaros por perto, nós tendemos à morte, nosso amor dura pouco.

dor de cabeça

medo de não pertencer
medo de mudar
medo de não dar certo
medo de não mudar
e a dor de cabeça

terça-feira, 3 de abril de 2012

espero

bom dia, meu bem, meu querido.
como estás? me conte sobre o teu dia.
espero que tenhas um ótimo dia.
espero que a tua tarde não seja tão quente ou tão triste
porque eu espero que fiques bem.
boa noite,
e dorme bem,
e acorda bem,
e fica bem,
e se alimenta bem,
e se cuida bem
e se cuida, tá?
e bom dia
e bons dias
e boa semana
e bons meses
e bons anos
eu espero que você tenha bons anos.

_
eu espero que você não sinta a angústia que sinto ao te querer bem e parecer convenção.

bom dia, fica bem, se cuida.

reverberar

agora o coração dança sem solavancos. reverbera essa plenitude que de tão grande faz o peito ficar maior que o mundo. a carne é de algodão branco. pele e cabelos cansados, o corpo pede descanso e pouco importa. eu fecho meus olhos pequenos, inspiro e me permito reverberar. leve tal qual algodão, me permito reverberar.