sábado, 5 de maio de 2012

Ponto Final

Acho que é uma das primeiras vezes que eu falo de ti com um sorriso no rosto. Claro, desde o tempo que a gente se afastou. Fica tranquilo, eu omiti tudo de ruim, só falei as coisas que são boas de se falar. A tormenta e as angústias... não importa. A gente só lembra do que quer, hoje eu quis pegar leve comigo. Lembrar já é um pouquinho 'contar uma mentira'. Pra si mesmo. Sem falar nada. E hoje eu fiz questão de mentir, mentir gostoso, pensando só no que foi verdadeiramente bonito na gente. A GENTE. Nunca tinha 'a gente'. Eu sempre cuidei de ti. Eu sempre cuido dos caras que eu gosto, de alguma maneira eu suporto, de alguma maneira a minha intensidade fica forte como concreto, e eu suporto, eu sou a barragem de um rio em declínio. Porque os caras que eu gosto são geralmente ímpeto sem controle, e eu suporto. Eu vejo nos olhos, eu escolho alguém que vai me deixar cansado, que vai me fazer ter que usar a força que eu tenho dentro de mim. Eu suporto. 
Daí eu percebi que pela primeira vez eu senti saudade de ti. Não era do teu corpo, era de ti. Do teu jeito, o cheiro da tua casa sempre desarrumada, fechada por causa do frio, cheiro de lugar fechado, cheiro do teu quarto com sono, cheiro do teu sono. Eu tentei pensar em alguma coisa tua que ainda tivesse comigo. Fiquei de cara, não tem nada que fosse teu, que tivesse tocado tua mão, teu rosto, teu cabelo, nesse meu quarto pequeno. Aquela coberta manchada com a tua porra era uma lembrança, aquela coberta eu botei fora. Era um jeito de lembrar de ti, mas eu botei fora. Eu olhava a mancha, lembrava demais. A empregada sempre achou que era pasta de dente. Ela entrava no meu quarto e eu olhava e ria, ela perguntava o porquê e eu não poderia dizer -a mancha que você tanto reclamou é porra. Porra. Porra, não tem nada teu aqui.
Tem uns fatos na minha vida, que se eu não conto pra alguém, é como se eles não tivessem existido. Por não contar eu vou esquecendo, só lembro do que eu quero. O meu passado parece muito mais bonito assim. A carona com o desconhecido, o meu amor louco com por um drogado, meus dias penosos nos postos de saúde, meu dia de party monster em Joinville, as caminhadas de três horas pela cidade de madrugada. Algumas coisas são verdades, outras não, mas de tanto eu contar e visualizar as imagens, fazem mais parte de mim do que uns fatos tediosos. Taí, deve ser por isso que tu parece tão distante de mim... Algumas mentiras são mais presentes na minha vida do que foi a nossa verdade.
Eu abri meu armário, o armário que tu nunca viu, com a fissura daquele tempo. Aliás, será que tu já deitou nessa cama? Talvez hoje eu durma menos vazio, talvez eu durma melhor, abraçando a lembrança da tua anatomia na minha cama. Peguei um shorts preto, meu, que tu costumava usar. Aposto que tu não ia reconhecer. Fiquei segurando. Ele ficava muito mais preenchido em ti. As minhas coisas ficavam muito mais preenchidas em ti. Eu também. 

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